STF: registros de terras de fronteira devem ser compatíveis com políticas agrárias

Os ministros do Supremo também fixaram que os registros de imóveis de fronteiras em terras indígenas são nulos.

Por unanimidade de votos, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiram que a ratificação de registros imobiliários decorrentes de alienações e concessões de terras públicas situadas nas faixas de fronteira deve estar condicionada à verificação se os imóveis rurais em questão submetem-se à política agrícola e ao plano nacional de reforma agrária. As terras consideradas de fronteiras são aquelas na faixa de 150 km paralela à linha da fronteira terrestre do território nacional.

Dessa forma, na visão dos ministros, a validação do registro imobiliário deve obediência à política agrícola e ao plano de reforma agrária; de modo a impedir que a ratificação dos registros torne-se apenas uma transferência de bens imóveis da União. Ou seja,  segundo especialistas consultados pelo JOTA, pela decisão, não basta o particular chegar no cartório e pegar o registro do imóvel, o poder público precisa avaliar se o uso da terra está compatível com as diretrizes constitucionais. O julgamento da ADI 5623 estava em plenário virtual e encerrou-se na sexta-feira (25/11).

Os ministros também fixaram que os registros de imóveis de fronteiras em terras indígenas são nulos, pois a lei de regularização fundiária não se sobrepõe aos direitos originários dos indígenas sobre as terras que tradicionalmente ocupam.

A validação do registro de terras situadas em zona de fronteira foi disciplinada pela Lei 13.178/2015 e, na época, o objetivo da lei foi corrigir títulos dados aos estados da federação a particulares de terras pertencentes à União, por serem de fronteira. No caso de glebas de até 15 módulos fiscais (quantidade de hectares que pode mudar conforme o município), a lei garante o registro.

Para os imóveis de dimensões superiores, a validação da propriedade foi condicionada à apresentação pelo particular de “certidão de georreferenciamento do imóvel” e da atualização de inscrição no Sistema Nacional de Cadastro Rural. Registro com área superior a dois mil e quinhentos hectares fica condicionada à aprovação do Congresso Nacional.

No entanto, a Lei 13.178/2015 foi contestada no Supremo Tribunal Federal (STF) pela Confederação Nacional de Trabalhadores na Agricultura (Contag). Para a Contag, embora a lei favoreça “parcialmente” os interesses de milhares de agricultores, ela também pode causar “graves e irreversíveis lesões à soberania nacional e ao meio ambiente, além de propiciar o enriquecimento sem causa de milhares de grileiros e incentivará a ampliação da desigualdade da nossa injusta estrutura agrária, prejudicando estes mesmos agricultores familiares no longo prazo”. Por isso, a confederação pediu ao Supremo para que exigisse da nova lei o cumprimento da função social da propriedade, com prioridade à reforma agrária.

Em seu voto, a relatora, ministra Cármen Lúcia, destacou que a discussão é de “importância especial porque a extensão territorial do país não diminui os conflitos, antes são muitos os que se relacionam à ocupação irregular, clandestina ou descumpridora das funções sociais a que ela se destina”, escreveu. “Grilagem, invasão e disputa pela posse, desmatamento ilegal, garimpagem, redução à condição análoga à de escravo, expulsão e morte de índios, tráfico de drogas nas fronteiras, dentre outros crimes, compõem o lamentável quadro socioeconômico de vastas áreas do território brasileiro”, complementou.

Diante do complexo sistema fundiário brasileiro, a ministra lembrou que a validação do registro imobiliário não pode ser confundida com a doação de terras públicas ou mesmo com a desapropriação para fins de reforma agrária, “a destinação dos imóveis, pela sua origem pública, deve se compatibilizar com a política agrícola e com o plano nacional de reforma agrária pelo disposto no art. 188 da Constituição da República”, informou.

E assim a ministra concluiu o seu voto: “Pelo exposto, voto no sentido de julgar parcialmente procedente a presente ação direta de inconstitucionalidade para atribuir interpretação conforme à Constituição aos arts. 1º, 2º e 3º da Lei n. 13.178/2015, fixando-se como condição para a ratificação de registros imobiliários, além dos requisitos formais previstos naquele diploma, que os respectivos imóveis rurais se submetam à política agrícola e ao plano nacional de reforma agrária previstos no art. 188 da Constituição da República e dos demais dispositivos constitucionais que protegem os bens imóveis que atendam a sua função social (inc. XXIII do art. 5o., caput e inc. III do art. 170, art. 186 da Constituição do Brasil)”.

Entenda

No passado, os estados brasileiros fizeram transferências de imóveis rurais localizados em faixa de fronteira a particulares. Em alguns casos as transferências envolveram imóveis de propriedade da União e não dos estados, por se tratarem de regiões de fronteira, portanto, de segurança nacional.

FONTE: JOTA

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