Carf afasta tributação previdenciária do auxílio-alimentação pagos via tíquete

O auxílio-alimentação pago pelo empregador aos seus empregados, quando de acordo com os programas de alimentação aprovados pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social, não devem integrar a base de cálculo das contribuições previdenciárias. É o que determina a Lei nº 8.212/91 (Lei de Custeio da Seguridade Social).

O tratamento isentivo em questão reforça o direito social ao acesso à alimentação previsto pelo artigo 6º da Constituição Federal. Sendo a alimentação um direito básico assegurado pela Constituição, o seu provimento passa a ser um dever do Estado, que tem a incumbência de promovê-lo e garanti-lo.

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Em vista disso, a Lei de Custeio da Seguridade Social prevê um rol de parcelas que não integram a base de cálculo das contribuições previdenciárias, conforme consta em seu artigo 28, parágrafo 9° e alíneas seguintes. Esse é o caso dos valores relativos ao auxílio-alimentação fornecido pelo empregador em favor de seus segurados.

Todavia, a compreensão do legislador ordinário deixou de alcançar os avanços tecnológicos e foi omissa nesse ponto, gerando dúvidas e insegurança jurídica nos contribuintes.

O artigo 457, parágrafo 2º, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) disciplina que o auxílio-alimentação (exceto quando pago em dinheiro) não integra a remuneração do empregado, não se incorporando ao contrato de trabalho e, consequentemente, não constituindo base de cálculo de encargo previdenciário.

Em sentido semelhante se posiciona o artigo 214, § 9º, inciso V, alínea “m”, do Decreto nº 10.410/2020, que alterou o Decreto nº 3.048/1999 (Regulamento da Previdência Social) para ratificar o entendimento trabalhista na esfera previdenciária e consignar a isenção do auxílio-alimentação, ainda que pago habitualmente, ressalvando-se quando o benefício for concedido em dinheiro.

Já há algum tempo, a opção pelo pagamento do auxílio-alimentação por meio de vales, tíquetes e cartões eletrônicos foi introduzida ao mercado. Referida “novidade” permitiu ao empregado valer-se de seu benefício sem restringi-lo aos alimentos in natura, imprimindo maior liberdade na utilização do benefício, sem, contudo, abdicar de qualquer controle de uso como seria na hipótese de o benefício ser pago em pecúnia.

A despeito da considerável adesão à modalidade, não houve, até o momento, adaptação da legislação previdenciária, tampouco dos atos normativos, de modo que há silêncio quanto a aplicabilidade do tratamento tributário especificamente ao auxílio-alimentação pago via vales, tíquetes ou cartões eletrônicos

A jurisprudência é pacífica quanto à não incidência das contribuições previdenciárias sobre o auxílio-alimentação pago in natura, ainda que fornecido por empresa não inscrita no programa de alimentação aprovado pelos órgãos governamentais (Programa de Alimentação do Trabalhador — PAT), na modalidade de refeições no próprio local de trabalho do empregado ou por meio da entrega de cestas básicas.

Contrario sensu, o entendimento jurisprudencial ainda não chegou a consenso quanto à tributação previdenciária do benefício concedido via tíquetes ou cartões eletrônicos.

Isso se deve, sobretudo, a uma primeira aproximação que foi feita dos cartões eletrônicos à figura do benefício pago em pecúnia, provocada pela estranheza do meio e pela adoção de juízo conservador ao analisar casos em que o contribuinte se valeu de tíquetes eletrônicos para providenciar o pagamento do auxílio-alimentação.

Em razão dessa insegurança jurídica, os contribuintes se viram restringidos à opção da concessão do benefício pela via in natura, menos benéfica ao empregado e muito mais trabalhosa para a empresa.

Mais recentemente, contudo, após densa evolução doutrinária e aperfeiçoamento na análise da matéria, a jurisprudência mostrou adaptação ao avanço tecnológico do pagamento do benefício e tem recepcionado alterações relevantes nos âmbitos administrativo e judiciário.

A exemplo disso, destaca-se o teor dos Acórdãos nº 2202-007.936, da 2ª Seção da 2ª Câmara da 2ª Turma Ordinária do Carf, e 2401-009.345, exarado pela 2ª Seção da 4ª Câmara da 1ª Turma Ordinária do Carf. Em ambos os casos, o Carf brilhantemente afastou a tributação previdenciária do vale-refeição e do vale-alimentação, consignando que os valores vertidos para esse fim não ostentam natureza salarial, entendimento este em confluência com a interpretação conferida pelo Superior Tribunal de Justiça [1].

Pelo entendimento do conselheiro Martin da Silva Gesto, redator do voto vencedor conferido ao Acórdão nº 2202-007.936, há clara dualidade na análise jurídica do auxílio-alimentação, qual-seja: admitir a não incidência das contribuições previdenciárias quando o pagamento é in natura ou reforçar a incidência quando o pagamento é feito em espécie ou creditado em conta-corrente.

Na omissão do legislador quanto ao tratamento específico a ser conferido ao auxílio-alimentação pago via tíquetes, o ilustre conselheiro esclarece a impraticabilidade de se comparar os tickets alimentação ao pagamento em espécie. Isso porque, diferentemente da moeda que possui curso forçado na extensão de todo o território nacional, o tíquete-alimentação não pode ser utilizado indiscriminadamente pelo seu titular, bem como não há qualquer obrigação de os estabelecimentos o aceitarem.

Há, portanto, crescente aceitação do entendimento que confere ao tíquete-alimentação interpretação equivalente ao benefício pago in natura, concedendo ao empregador maior segurança jurídica quanto à não incidência das contribuições previdenciárias sobre tal valor, privilegiando o direito social à alimentação e buscando viabilizar a sua efetivação mediante a sua desoneração.

[1] Nesse sentido vide Recurso Especial nº 1.185.685, 1ª Turma do STJ, Relator Ministro Luiz Fux, publicado no DJE 10.5.2011 e Recurso Especial nº 1.023.053, 4ª Turma do STJ, Relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, publicado no DJE 16/12/2011

Fonte: ConJur

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